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Da retórica do bombardeio ao massacre anunciado: o que está em jogo na Penha?

Não se trata aqui de defender o crime organizado, mas de reconhecer que o Estado brasileiro não pode assumir práticas de extermínio como política pública de segurança

Jornalista e Advogado Raudrin de Lima
30/10/2025 01h32 - Atualizado há 1 semana
Da retórica do bombardeio ao massacre anunciado: o que está em jogo na Penha?
Foto da Folha de São Paulo do massacre

Nos últimos dias, o Brasil assistiu a um cenário que não pode ser tratado como coincidência política. Após a polêmica fala do Senador Flavio Bolsonaro, sugerindo de forma irresponsável uma intervenção militar estadunidense na Baía de Guanabara, surge uma operação policial devastadora na comunidade da Penha, no Rio de Janeiro, resultando em um número de mortos que, segundo relatos e levantamentos de redes comunitárias, pode ter ultrapassado uma centena de pessoas.

 

O governador Cláudio Castro, ao se pronunciar, apresentou uma versão oficial: tratava-se de uma ação contra a facção Comando Vermelho. Mas a pergunta que se impõe, de forma urgente, é a quem interessa transformar uma comunidade urbana em território de guerra?

 

Não se trata aqui de defender o crime organizado, mas de reconhecer que o Estado brasileiro não pode assumir práticas de extermínio como política pública de segurança. E quando mortes em massa são tratadas como dados estatísticos ou troféus políticos, algo muito grave está se consolidando.

 

A militarização como projeto

 

Há anos, setores da extrema direita brasileira defendem a ideia de que as periferias são “zonas inimigas” a serem ocupadas com força letal. A narrativa é clara: pobres, negros e favelados são vistos não como cidadãos, mas como alvos potenciais.

Quando Flávio Bolsonaro flerta publicamente com a possibilidade de solicitar bombardeios norte-americanos em território nacional, não se trata de uma bravata isolada — é coerente com um projeto político que normaliza a violência estatal extrema.

 

A operação na Penha pode não ser consequência direta daquele discurso, mas não podemos ignorar a atmosfera política em que ela ocorre. Atmosfera onde:

 

  • Direitos humanos são tratados como obstáculo.
  • As polícias são estimuladas a agir como exércitos.
  • Governadores disputam quem “mata mais” para ganhar popularidade eleitoral.

 

 

Quando a vida perde valor

 

Se os mortos da Penha fossem:

 

  • Moradores da zona sul,
  • Empresários,
  • Filhos da elite,

 

teríamos manchetes, comoção nacional, investigações urgentes, pronunciamentos oficiais em cadeia nacional.

 

Mas como são corpos de jovens negros, pobres, moradores de periferia, a narrativa oficial já os sentencia como culpados: “eram da facção”.

 

Desde quando execução sem julgamento é solução?

 

Desde quando Estado vira carrasco?

 

O recado é político

 

O massacre da Penha não foi apenas uma operação.

Foi um recado.

Um aviso de que o Estado brasileiro, em determinados territórios, já não opera mais sob a Constituição.

E quando um país naturaliza o assassinato em massa de sua própria população “em nome da segurança”, ele flerta com algo que a história mundial conhece bem demais: projetos autoritários que começam pela periferia, mas nunca terminam nela.

A pergunta que não pode calar

O que está acontecendo no Rio é um ensaio de algo maior?

A extrema direita busca:

 

  • Testar limites institucionais?
  • Normalizar operações de extermínio?
  • Construir apoio popular para um Estado policial permanente?

Essa é a discussão urgente.

E ela não pode ser abafada por manchetes superficiais.

Conclusão

Quando vidas se tornam descartáveis e a violência do Estado é celebrada como espetáculo, a democracia está em risco.

A história exige que não nos calemos.

Ou denunciamos agora, ou normalizamos o intolerável.

 

 

 

Por Raudrin de Lima

Jornalista e Advogado Membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB-AL

 

FONTE: Jornalismo News
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